Reforma da Previdência e a progressividade na pauta do Judiciário

Entraram em vigor as novas alíquotas de contribuição previdenciária a serem pagam por aqueles enquadrados no Regime Geral da Previdência Social e também para o Regime Próprio de Previdência social.

A Reforma da Previdência, materializada pela Emenda Constitucional n. 103/19, alterou por completo a sistemática de alíquotas dos dois regimes, permitindo, a contragosto, principalmente, de grande parte (quiça todo) o funcionalismo público a temida progressividade.

Dessa forma, no caso dos servidores públicos federais, enquadrados no Regime Próprio, a alíquota que anteriormente era fixa de 11% passou a ser escalonada tendo como base o salário dos servidores publicado, podendo alcançar o patamar máximo nominal de 22%.

Apesar das alíquotas do regime geral também terem sido alteradas prevendo uma progressividade de 8% a 11%, chamou mais atenção o novo patamar das alíquotas para o regime próprio. E não é preciso ter vivido muito tempo no Brasil para saber que o caos foi instaurado dentro das trincheiras dos sindicatos e associações dos servidores públicos federais.

Assim, o Sindicato dos Servidores das Justiças Federais do Estado do Rio de Janeiro (SISEJUFE)  e a Associação dos Procuradores Federais no Estado do Rio de Janeiro (APAFERJ) já conseguiram na justiça liminares afastando tanto a cobrança da alíquota progressiva das contribuições previdenciárias como das nebulosas contribuições previdenciárias extraordinárias. Existindo milhares de outras ações em tramitação.

Mas há razão para gerar tamanha discussão?

A progressividade e as novas alíquotas para o RPPS foram vendidas pela equipe econômica do governo federal como uma boa solução para equilibrar os altos salários pagos na administração federal, tendo sido, na proposta inicial, prevista uma economia fiscal de R$ 45,2 bilhões (em 20 anos) apenas no RPPS.

No entanto, até mesmo para um advogado, com o autor que vós fala, a matemática parece não bater. A progressividade tem a premissa duvidosa de que os que ganham mais, passaram a pagar mais e, com isso, o sistema tende ao equilíbrio.

Contudo, no caso das alíquotas de contribuição previdenciária, existe uma variável a mais no cálculo que pode minar a economia fiscal pretendida com a as mudanças no sistema previdenciário: a relação inversa entre o valor pago a título de contribuição previdenciária e o valor do Imposto de Renda das pessoas físicas.

Ou seja, quanto maior a contribuição previdenciária paga, menor a base de cálculo do Imposto de Renda desses servidores e, por certo, menor a arrecadação. Com a perda de receita do Imposto de Renda, a conta acaba não fechando.

Em relatório elaborado pelo Instituto Fiscal Independent, conclui-se que após incluir no cálculo a perda de arrecadação com o IR “(…) o impacto líquido negativo passa a ser de R$ 26.258, milhões no RGPS e de R$ 18.440,1 milhões no RPPS e o balanço entre os dois passa a ser negativo em R$ 7.818,4 milhões (…) em resumo, a avaliação do impacto das mudanças nas regras de contribuições indica uma perda na arrecadação da ordem de R$ 7,8 bilhões em uma década e não uma situação de neutralidade fiscal”.

Nada de economia fiscal por aqui, apesar das penosas alíquotas.

Mesmo que fosse possível considerar que as alíquotas progressivas dos servidores públicos federais gerassem uma economia fiscal significativa, ainda existem uma série de questões que devem ser debatidas antes de dizer que a progressividade foi, de fato, uma jogada de mestre.

O sistema previdenciário brasileiro tem como um dos principais pilares o equilíbrio atuarial e a isonomia. Transferindo o ônus de equilibrar o sistema previdenciário para os servidores públicos federais, por certo não se pode dizer que esses pilares estão sendo respeitados.

Já a isonomia, princípio de estatura constitucional, não significa defender que todos paguem a mesma quantia, mas tem como função garantir que todos contribuam dentro de suas capacidades, garantindo efetividade à própria capacidade contributiva, tão cara em nosso ordenamento.

Ou seja, também não se pode, de maneira completamente arbitraria, eleger uma classe de pessoas como a base de custeio do sistema previdenciário brasileiro. Ainda, o sistema previdenciário desenhado pela Constituição Federal tem o caráter contributivo e redistributivo, em que todos devem contribuir, dentro de suas capacidades. Se há uma situação de déficit, todo o sistema deveria arcar de maneira proporcional.

Vale destacar também que há em tramitação no Supremo Tribunal Federal, sob a Relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso, diversas Ações Diretas de Inconstitucionalidade que discutem a compatibilidade da progressividade, contribuições extraordinárias e outros aspectos da Reforma previdenciária com a Constituição Federal.

Se há ou não uma caça aos servidores públicos federais para gradualmente tornar o funcionalismo público menos atraente e, de maneira completamente paralela e arbitraria, enxugar a máquina pública, não é possível dizer. No entanto, os chamados de parasitas vêm, ao menos, desenvolvendo um trabalho primoroso (e penoso) em equilibrar as contas.

Fonte: JOTA